segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Astrogastropsiconomia

Entre um bolinho de arroz e uma rabada com agrião, descobri que minha angústia existencial era tão simples quanto uma farofa de ovos. Até então, meus olhos corrompidos pela fome, pareciam calibrados para só perceber a dor como figura, pulando de uma desgraça para outra, todo resto sendo fundo difuso e não identificável. Não tive a fome dos miseráveis, dos despossuídos; tive a fome medíocre dos alienados de seus estômagos. Quer dizer, pra onde olhasse, via tristeza, via desgosto, via arrependimento. Era como se toda a realidade concreta e abstrata ganhasse a disformidade dos reflexos no fundo de um prato vazio. Esse mal estar mobilizava toda minha atenção. Só conseguia pensar em investigar minhas emoções, meus comportamentos querendo entender o que estava errado para corrigí-lo. Essa alienação de mim mesmo, ou seja, o inacreditável desconhecimento das ligações entre meu humor e meu estômago me mergulhou em elocubrações infindáveis sobre uma infelicidade que me parecia cada vez mais complexa e perigosamente sedutora. Me enredei como um peixe que, desesperado, se debate à exaustão entre as malhas. Acabei, de alguma maneira, achando um caminho frágil e trôpego. Só bem mais tarde é que fui entender que tudo se resumia a um bom prato de comida em horários razoavelmente regulares três ou quatro vezes ao dia. De vez em quando, ainda ouço tenebrosos sussurros de angústia, mas, antes de qualquer coisa, sirvo-me um belo prato de comida pra, só depois da sobremesa, dar ouvidos aos demônios que porventura não foram exorcizados pela dica do chef.

3 comentários:

Anônimo disse...

O importante é descobrir a algas marinhas nas entranhas de um tubarão e permanecer vivo.

Diego Rodrigues disse...

Como se fosse um imenso sushi ao avesso: peixe cru recheado de algas. Vai molho shoyu nessa receita?

Diogo Cão disse...

vão comer, meus filhos, que quem está de barriguinha cheia feliz e satisfeito não se perde nestas elocubrações.