segunda-feira, 10 de dezembro de 2007


eu sou uma sombra. uma lembrança vaga e nebulosa dos seus sonhos, algo que está navegando sobre o tênue limite da realidade e da ficção. sou um vestígio nas memórias mais longínquas. algo que está retratado em algum lugar. um espectro com uma voz cujo timbre se perdeu no tempo, com uma face cujas linhas se dissiparam no ar, com um corpo cuja matéria está em algum lugar que não aqui, que não agora.

algo que já existiu... ou não?

algo incerto.

um frio na espinha. uma premonição antiga. uma intuição. o cheiro de um perfume cujo nome nunca existiu. um olhar paradoxal: penetrante, ao mesmo tempo que fugaz. buscas nas fotos minha imagem, e não a vês; quando a vês, ainda assim não distingue seus traços. quem é esta pessoa? quem é você, afinal? buscas em vídeos, em cartas, em objetos, nas memórias de outras pessoas. elas concordam: existe algo. alguém. quem? onde está?

me confundem com a brisa fria das madrugadas. com os passos furtivos em ruas escuras. com todas as imagens periféricas indefinidas, interpretadas pela mente simplesmente como aquilo que ela quer ver. o pensamento busca aquilo que não pode compreender. os sustos provocados por essas sensações ambíguas, por essas impressões incompletas, esse intervalo mais longo entre a inspiração e a expiração!; ah, tua própria sombra te engana.

não podes me ver. e então me verás: em todas as faces sem reflexo, em todos os corpos sem rosto, em todas as cidades apinhadas de gente, nos bosques mais ermos do fim do mundo, nas memórias de gente que nunca viste (que nunca te viram). eu sou, mas não estou. e todos aqueles que já não estão, todos são comigo. transitando no mesmo véu de dimensões intocáveis, caminhando sobre os mesmos planos, se dissolvendo e materializando em diferentes andares do edifício dos sonhos onde transitas nos teus raros momentos de inexistência, onde bebes chá e vinho conosco todos os dias e noites, até que despertas para uma realidade onde restam apenas vestígios, onde estamos presentes em cenhos franzidos, em olhares fugidios, e em saudades perenes.


imagem: capa de Dream Notes (2007), Theodor Adorno.

2 comentários:

Diego Rodrigues disse...

Diogo cão, é com grande orgulho que anunciamos a superação da cota mensal de textos estabelecida pela nossa matriz. E seu esforço foi fundamental pra esse sucesso. Em nome do nosso digníssimo Presidente, queremos parabenizá-lo e anunciar que, em sinal de reconhecimento de seu trabalho, a cota de textos para o bimestre janeiro/fevereiro de 2008 aumentará em 20%. Certos de que estará a altura do desafio, reiteramos nosso orgulho em o termos como parceiro.

Atenciosamente,

Equipe de Acompanhamento e Motivação Setorial - EAMS
Departamento de Diversões Públicas e Pesca Predatória - DDPP
Net Global Wolrd Business Corporation

Diego Rodrigues disse...

C'est comme si on pouvait sentir une presence, on pouvait voir une silhouette, mais on ne pourrait, malgré nos efforts, jamais regarder cette figure face-à-face. Ça sonne comme une idée qu'on a l'impression d'avoir eu un jour, mais qu'on arrive jamais a nous souvenir exactement. Elle insiste à nous échapper. Tu avais oublier de me dire quelque chose. Peut-être cette chose n'a, en faite, jamais existé.