quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

A beata

A voz, mesmo rouca, se sobrepõe aos ruídos e domina a cena pela sincronia e coerência dos movimentos corporais com o tom das palavras. O jeito da beata contido pela culpa cristã contrasta com a eloqüência verborrágica da pregação. Esses dois momentos se opõem pela maneira distinta de lidar com um impulso primal: o medo. Ora o medo é contido, enjaulado dentro do recato das boas maneiras, ora entra em intensa combustão e incendeia o comportamento, ejacula. Parece que o missionarismo, a salvação das almas alheias, alivia o furor interior da culpa. Alivia ou desvia momentaneamente a atenção. Os olhos quase permanentemente fechados indicam que mesmo os berros e apelos aos pecadores são muito mais uma reação a um embate interno do que um diálogo estabelecido com o mundo externo. Os pecadores não têm uma existência complexa a ser desvendada, contemplada, eles têm apenas o vício a ser extirpado, elas são o vício a ser extirpado. O poder da palavra não é o alcance da voz. O poder da palavra é a força da presença. E essa presença que explode energicamente altera tudo. O grito de um histérico habitual é distinto do grito de um recluso. Só o segundo cala a multidão. E a multidão mobilizada pela ruptura do momento é guiada pela voz rouca de quem seqüestrou violentamente os corações desesperançados. Sim, há finalmente uma salvação... enquanto se convencer disso o salvador.

6 comentários:

Diego Rodrigues disse...

Sua crítica não tem credibilidade. Seu olhar é totalmente enviesado pela paixão. Tudo parece bonito, certo.

Diego Rodrigues disse...

Mas, te pergunto, que olhar está livre do viés das emoções? Quem, sob qualquer circunstância, algum dia projetou um olhar genuinamente objetivo sobre o mundo? Quem?

Diego Rodrigues disse...

Ainda que seja inalcançável, deve-se buscar a neutralidade.

Diego Rodrigues disse...

Pois eu abdico da neutralidade sendo ela inalcançável e sua busca, portanto, vã. Por que não haveria de abdicar se conheci uma subjetividade que tinge o mundo de poesia?

Anônimo disse...

Quem sou eu pra falar das emoções que tornam as opniões dos apaixonados previsíveis?

quero viver. comer a sobremesa antes de almoço se assim desejar

Diogo Cão disse...

ora los recelos son contidos en las murallas de la imparcialidad; ora son inmolados en el ardor del discurso. ¡bailen, amados míos! ¡que los contrastes sean solamente las dos puntas de la cuerda floja donde tanguean los apasionados!