sábado, 5 de abril de 2008

ah, como era bela a garoa que caía sobre Brasília! sob a luz do poste ela se desnudava, beijando as também nuas, calçadas frias, sedentas de companhia, brilhando amarelada nos pontos onde se a via; como era bela a garoa, como era boa! a garoa que caía, dançava com ternura, leve, sem valentia, sobre a cidade quase vazia, os carros passando, com seus faróis acelerados, curvas impróprias, sinais desobedecidos, e as asas abertas, braços abertos, com as palmas para cima; ela vinha serena, sobre a minha roupa, sobre a minha pele, sobre a minha cabeça, sobre tudo o que existia; há quanto tempo eu não a via! minha mente vazia, meus passos rápidos, ela caía leve, entregue à gravidade, entregue a mim que até então não sabia, o quão grandiosa, o quão companheira, no meio da madrugada, ela seria, tão doce, tão bela, caindo sobre mim, caia sobre todos, caia sobre o mundo, desabe em gotinhas, arrebate, prossiga, tão serena, desnuda, tão minha, [ninguém mais a via!] éramos eu e ela, éramos só nós, garoa fina, esta calçada fria, sua entrega incontida, sua nudez sem valentia, sua ternura sobre a cidade vazia, eu a via, ela havia, como era boa, como era bela, uma mera garoa, sobre Brasília!

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